25 anos de Chrono Cross: a joia dos RPGs dos anos 90 que ousou seguir um caminho diferente das sequências óbvias (2024)

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O que você faria se descobrisse que existe uma outra dimensão na qual você morreu, e todas as pessoas que você admira ou simplesmente está acostumado a conviver diariamente está morta ou simplesmente não te conhece (ou reconhece)? De todas as formas de ficção existentes, as realidades alternativas estão entre as mais exploradas, talvez superadas apenas pelas histórias de viagem no tempo, mas cair sem aviso num mundo que soa hostil, diferente e, ainda assim, familiar, pode ser também uma oportunidade para estabelecer novos laços e transformar vidas que seguiriam um destino muito distinto não fosse a sua presença ali, seja para o bem ou para o mal.

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De certa forma, a história de Serge, Kid, Harle, Lynx e compahia em Chrono Cross, clássico do PlayStation 1 lançado há 25 anos, em 18 de novembro de 1999, aborda todos esses temas de um modo que nenhum outro RPG havia feito até então, e talvez o maior mérito do jogo, além de ser um dos melhores títulos de sua época e um dos melhores RPGs de todos os tempos, foi ter ousado seguir um caminho diferente das sequências seguras e óbvias, afastando-se em vários aspectos do também extraordinário Chrono Trigger, um dos games mais importantes e aclamados da história.

Dirigido por Masato Kato, que embora não seja mencionado no Dream Team de Chrono Trigger, participou ativamente do desenvolvimento do clássico de 1995, sendo roteirista do jogo ao lado de Yuji Horii (criador de Dragon Quest, Yoshinori Kitase (diretor de Final Fantasy VI, VII, VIII e X) e Yasuhiko Kamata, Chrono Cross abdicou dos protagonistas do jogo original em nome de um elenco quase inteiramente novo, trocou o tema de viagem no tempo pelas dimensões paralelas, deu possíveis destinos trágicos a personagens amados de Chrono Trigger (embora nada tenha sido oficialmente confirmado) e, naturalmente, atraiu reprovação de uma parte significativa de seu antecessor.

Kato talvez tenha apostado alto demais em não fazer de Chrono Cross um "Chrono Trigger 2", mas também foi esse desejo de ousar que fez do jogo um dos títulos mais lembrados do PlayStation até hoje. Ousadia por si só, porém, não faz nenhuma obra alcançar a excelência, mas a forma como Chrono Cross foi construído fez dele um game tão arriscado quanto marcante na história dos RPGs.

*Alerta: os parágrafos a seguir contêm vários spoilers e detalhes da história de Chrono Cross e Chrono Trigger. Este é um texto voltado para quem jogou ambos os títulos.

Desafiando o destino

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Chrono Cross é uma daquelas obras que sintetizam uma era dos videogames. A quinta geração de consoles, liderada pelo PlayStation 1, Nintendo 64 e Sega Saturn, marcou a transição para os gráficos 3D após o enorme sucesso das gerações de 8 bits (NES e Master System) e 16 bits (Super Nintendo e Mega Drive), marcadas pela pixel art. Naquele período, os estúdios passaram a investir em grandes aberturas com ares cinematográficos e gráficos de ponta para a época, e poucos jogos conseguiram produzir aberturas tão marcantes quanto o RPG de turnos da Square Soft (hoje Square Enix).

Em uma das melhores trilhas sonoras da história dos games, Yasunori Mitsuda, que já havia composto a maior parte da trilha de Chrono Trigger, realizou um trabalho ainda mais primoroso em Chrono Cross. A abertura do jogo, que reunia uma série de cutscenes belíssimas da história, era acompanhada pela genial Time's Scar, que já dava ali aos jogadores o recado de que que aquele não seria apenas mais um jogo, e sim uma experiência única, com direção de arte e gráficos espetaculares, uma trilha sonora extraordinária e uma história que carregava beleza, leveza e tragédia, como poucos jogos até então, ou mesmo depois, fizeram.

Mergulhar na abertura de Chrono Cross, ou mesmo na tela inicial do jogo, que enfatiza o mar do arquipélago de El Nido, palco principal do jogo, transmite a sensação de mergulharmos num sonho do qual não queremos acordar. Conforme conhecemos a história de Serge, um garoto de 17 anos que vive uma vida pacata no vilarejo de Arni, mas que no fim terá um papel fundamental para o destino do mundo, aprendemos que o destino é algo contra o qual muitas vezes vale a pena lutar, pois até mesmo a noção de livre arbítrio é questionada ao longo da campanha. Afinal de contas, as decisões que tomamos em nossas vidas são mesmo nossas ou apenas fruto de uma manipulação muito anterior, da qual nem temos conhecimento? Os chamados "Records of Fate" desempenham papel fundamental no controle das vidas dos moradores do arquipélago de El Nido, pois ditam o que cada um deve fazer para que aquele mundo permaneça em "harmonia".

De certa forma, a jornada de Serge é, no fim, uma jornada contra o destino, inclusive dele próprio, pois a simples existência do protagonista já é fruto de uma interferência anterior que impediu sua trágica morte aos 7 anos de idade, mas apenas em uma das duas dimensões do jogo. Na outra, mesmo após ser salvo em um primeiro momento, o "destino (FATE)" fez tudo que estava ao seu alcance para garantir que o garoto morresse e não interferisse em seus planos.

A história de Chrono Cross começa com Serge despertando de um pesadelo no qual ele e outros dois personagens, uma jovem chamada Kid e um terceiro personagem aleatório, exploram um templo chamado Fort Dragonia. Em dado momento desse sonho, Serge ataca Kid com uma faca, ferindo a garota aparentemente de forma mortal e sorrindo naquilo que poderia ser um pesadelo, uma lembrança esquecida ou uma visão do futuro, algo que só descobrimos no decorrer da campanha.

Após acordar, Serge tem uma breve conversa com a mãe e a partir daí começamos a conversar com outros moradores de El Nido, desde uma jovem que deseja viajar o mundo apresentando poesias até um ancião chamado Radius que ensina a Serge (e ao jogador) noções básicas do sistema de combate do jogo e do uso de magias elementais. O grande destaque desse começo de campanha, porém, é o de Serge com Leena, interesse amoroso do jovem que exige que ele consiga encontrar três escamas de Komodo antes de encontrá-lo na praia de Opassa. Após enfrentarmos nossos primeiros inimigos e finalmente coletarmos as escamas, Serge chega ao encontro de Leena, mas entra em uma espécie de transe e sente ser dragado pelo mar antes de desmaiar.

Ao acordar, Serge acorda em um mundo praticamente idêntico ao dele, mas com uma grande diferença. Neste mundo, Serge morreu quando ainda era um garoto de apenas sete anos, e sua aparição no local onde seu corpo fora enterrado faz com que um grupo conhecido como Acacia Dragons, considere que Serge é, na verdade, uma espécie de fantasma do garoto que morrera 10 anos antes. Quando Karsh e seus subordinados Solt e Peppor tentam levar Serge, uma misteriosa jovem chamada Kid aparece para ajudar o protagonista, e pouco depois de derrotar os Acacia Dragoons, os jovens partem juntos em uma jornada que mudaria a vida de todo aquele mundo para sempre.

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Nesse caminho, eles conhecem diversos outros personagens jogáveis que podem ou não se tornar aliados, dependendo de nossas decisões, mas a grande ameaça a Serge é uma criatura de aparência felina chamada Lynx, que parece ter interesse particular em Serge, pois naquele mundo o garoto se tornou o árbitro de um poderoso artefato mágico chamado Frozen Flame, um fragmento deixado na Terra por Lavos, vilão final de Chrono Trigger. Como braço direito de Lynx, surge uma jovem chamada Harle, que com seus trajes e maquiagem de palhaça parece ser leal a Lynx, mas mantém um interesse especial por Serge, numa relação que se desenvolve por meio de interações ao longo de dezenas de horas de campanha e rende alguns dos melhores diálogos do jogo.

A trama de Chrono Cross é centrada principalmente nesses quatro personagens, embora mais de 40 sejam jogáveis. Ainda assim, o jogo mostra que a maioria dos coadjuvantes têm, em algum momento, uma participação importante na trama, em uma metáfora que vale para a própria vida. Afinal, existem aquelas pessoas que têm um papel mais central e permanente em nossa trajetória, mas ao longo das nossas vidas temos vários encontros mais pontuais com pessoas que, em alguma medida, se tornam importantes para nós, ainda que de forma efêmera.

É exatamente assim que os coadjuvantes de Chrono Cross atuam no jogo: eles podem não ser figuras centrais por toda a história, mas são fundamentais em momentos específicos da trama. Leena, Karsh, Ridel, Korcha, Glenn, Razzly, Fargo, Viper e companhia são todos importantes para o desenvolvimento da trama e de Serge e Kid enquanto personagens, e o fato de todos serem jogáveis amplia as possibilidades de estratégias de gameplay de Chrono Cross, além de desbloquear diálogos específicos quando algum deles está em nosso time.

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Quando Kid e Lynx se encontram pela primeira vez na campanha, Chrono Cross vive um de seus momentos mais memoráveis. Afinal de contas, Kid busca vingança contra Lynx pelo fato de o vilão ter atacado o orfanato em que Kid vivia com Lucca e várias outras crianças, mortas em um ataque promovido pelo vilão e por Harle quando Kid ainda era uma criança. Lucca, cujo destino é desconhecido, foi possivelmente sequestrada pela dupla de antagonistas e morta, mas este é um dos maiores mistérios de toda a franquia Chrono, pois nenhuma teoria dos fãs sobre este tópico foi oficialmente confirmada até hoje.

Laços que perduram

As conexões entre Chrono Trigger e Chrono Cross são sutis na maior parte do tempo, mas também inequívocas. Kid, por exemplo, é o bebê que Lucca encontra em uma floresta com o colar de Schala no encerramento da versão de Chrono Trigger para PlayStation, e Chrono Cross mostra já nas primeiras horas de campanha que mais do que apenas mergulhar em uma jornada sobre um grupo de heróis improváveis salvando o mundo, o jogo quer explorar aspectos mais pessoais da vida de cada personagem, sejam eles protagonistas, vilões ou coadjuvantes com participações bem pontuais na trama.

Mais do que apenas valorizar os aspectos grandiosos da história, Chrono Cross se preocupa em enfatizar por que os laços entre os personagens são o que realmente move a trama, até mais do que salvar o mundo em si. Serge, no início um garoto ilhéu de vida simples e ambições modestas, descobre aos poucos mais sobre a própria história e, do meio para o fim da campanha, a importância de seu papel para evitar o colapso do contínuo espaço-tempo e, de alguma forma, salvar Schala. A antiga princesa do Reino de Zeal acabou fundida a Lavos numa dimensão conhecida como Darkness Beyond Time (Escuridão Além do Tempo), formando uma poderosa entidade conhecida como Time Devourer, capaz de acabar com toda a vida existente quando Schala não mais resistir à influência e ao poder de Lavos.

Kid, embora tenha um papel imprescindível na trama e uma missão grandiosa, é a todo momento movida mais pelos laços que estabeleceu na infância com Lucca, seus irmãos de orfanato e, ao longo da trama, com o próprio Serge. Lynx, apesar de elaborar planos maquiavélicos e ser capaz de verdadeiras atrocidades, é, de certa forma, uma vítima de alguns dos eventos mais relevantes da trama, afinal ele é uma versão corrompida de Wazuki, pai de Serge, por influência do supercomputador FATE. E até mesmo Harle, a misteriosa assistente de Lynx no começo e meados da campanha, existe apenas pelo desejo de uma entidade chamada Dragon God, e sabe que sua missão e destino estão acima de seus próprios desejos, algo de certa forma lamentado pela própria personagem já na reta final da trama.

Quebrando o molde

Mais do que seguir a fórmula segura de criar sequências que modificam apenas aspectos pontuais de seus antecessores, Chrono Cross se destaca por utilizar apenas algumas bases de Chrono Trigger, mas ousando, com enorme êxito, vários pontos do clássico de 1995. Cross, de fato, não é Chrono Trigger, e este foi o grande acerto do time liderado por Masato Kato.

A primeira mudança radical de Chrono Cross em relação ao seu antecessor foi a opção de se trabalhar com apenas duas dimensões paralelas, mas que existem num mesmo recorte temporal (1020 AD), ao invés das viagens por diferentes momentos da história vistas em Chrono Trigger. A outra, e de maior impacto, é a ausência quase total de personagens do jogo original. Afinal, o que aconteceu com Crono, Marle e Lucca?

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Na campanha de Cross, nada disso é explicitamente revelado, mas o recado de Masato Kato parece claro: o mundo é muito maior do que os antigos protagonistas da série. Há outras histórias que podem e precisam ser contadas, e muitas vidas foram afetadas, para melhor ou pior, pelas interferências feitas em Chrono Trigger. Em um determinado momento do jogo, Kid lê uma carta escrita anos antes por Lucca, na qual a própria cientista se questiona sobre o efeito das mudanças no fluxo da história feitas por ela e seus amigos, e do quão eticamente correto foi fazer isso para salvar mundo. Conforme as camadas da trama de Chrono Cross são reveladas, adquirimos a habilidade de viajar livremente entre as duas dimensões do jogo (Home World, onde Serge sobreviveu, e Another World, onde o jovem morreu ainda criança), e a partir daí descobrimos como diferentes experiências vividas por um mesmo personagem podem mudá-lo por completo.

Karsh, o guerreiro dos Acacia Dragoons que morreu durante uma missão na dimensão de Serge, justamente em função da interferência que manteve o protagonista do jogo vivo em Home World, ainda existe em Another World, onde Serge não teve seu destino trágico evitado. Em um dado momento da trama, Karsh vai a Home World e encontra o seu “pai” Zappa, mas o diálogo entre ambos revela que, apesar dos laços sanguíneos, o evento não tem o impacto emocional que se poderia esperar. Afinal, Zappa sabe que seu verdadeiro filho está morto, e reencontrar uma outra versão de Karsh, ainda que lhe proporcione um conforto temporário, não trará o guerreiro que pereceu em Home World de volta à vida.

O mesmo vale para Gogh, que em Home World é um artista de muito talento mas pouco sucesso, o que faz ele e seu filho, Van, viverem em dificuldades, mas terem uma relação muito próxima. Em Another World, Gogh desistiu de virar um pintor e se tornou um comerciante riquíssimo e capaz de proporcionar uma vida bastante confortável a Van. Essa decisão, no entanto, fez dele um homem dedicado inteiramente ao trabalho, o que deteriorou completamente sua relação com o filho. E parte da magia de Chrono Cross reside justamente em linhas de diálogo que, ainda que breves, evidenciam esses contrastes entre as duas dimensões do jogo.

Em Chrono Cross, situações assim são apresentadas frequentemente, e a decisão de tornar tantos desses personagens jogáveis faz nos importarmos mais com eles. No fim, a maioria tem deles tem uma motivação bastante particular para se unir a Serge e ajudar a desvendar os mistérios daquele universo, ainda que por uma simples dívida de gratidão com o garoto.

Conhecer essas pequenas histórias também nos dá a real noção do quanto a sobrevivência de Serge mudou (e moldou) o destino de muitas outras pessoas. Fica claro que mesmo quando se evita uma tragédia, seja ela a destruição do mundo ou a morte de uma criança, há um preço alto a se pagar por essas ações, algo que já havíamos visto no game anterior da série. Em Chrono Trigger, a queda do Reino de Guardia no ano de 1005 AD (cena final da versão do jogo para PlayStation) jamais teria ocorrido se Crono e companhia não viajassem no tempo para evitar a destruição do mundo por Lavos em 1999 AD.

Em Chrono Cross, a interferência de Schala — a princesa do Reino de Zeal desaparecida ainda durante os eventos de Chrono Trigger — para salvar Serge do ataque da pantera-demônio foi a principal responsável pelos desdobramentos do jogo, e impedir a morte do protagonista teve inúmeras consequências negativas, sobre as quais só tomamos conhecimento conforme progredimos na campanha. Vale lembrar que ao salvar Serge, Schala já estava fundida a Lavos na dimensão Darkness Beyond Time, formando uma entidade chamada Dream Devourer, o chefe secreto na versão de Chrono Trigger para Nintendo DS. Antes de ter sua mente completamente deteriorada pela fusão com Lavos e evoluir para uma criatura conhecida como Time Devourer, Schala usou seus poderes para salvar Serge, mas essa decisão teve um alto custo.

Uma das consequências mais trágicas, embora involuntária, foi a deterioração da mente de Wazuki, pai de Serge, que após chegar à estação de estudos temporais Chronopolis graças aos poderes de Schala, curou o filho expondo-o à Frozen Flame, fragmento que se descolou de Lavos quando ele caiu sobre a Terra. O problema é que o tal artefato era protegido pelo supercomputador FATE, que perdeu o controle sobre ele após Serge passar por essa exposição direta e se tornar o novo árbitro do artefato. FATE, então, decide tomar controle parcial da mente de Wazuki, que pouco depois sucumbe totalmente à influência da máquina e mata o próprio filho afogado na dimensão de Another World. Assim, a “normalidade” daquele mundo seria restabelecida, não fosse o surgimento de uma dimensão paralela onde Serge sobreviveu à tentativa de afogamento justamente pela interferência de Schala.

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Disposta a salvar o garoto de um destino ainda mais trágico do que a morte pelas garras da pantera-demônio, Schala fez um clone de si própria, Kid, e manda o bebê para o ano de 1004 AD. É neste momento que Lucca encontra Kid, que anos mais tarde impediria o afogamento de Serge pelas mãos de Wazuki. A consequência foi o surgimento de Home World, um mundo onde o garoto está vivo e FATE não pode manipular as mentes dos habitantes de El Nido por meio dos Records of FATE, os cristais verdes que servem como save points de Chrono Cross. Não por acaso, nenhum cidadão de Another World, onde o supercomputador ainda exerce total influência e Serge está morto, deseja sair do arquipélago, diferentemente do que ocorre em Home Word. O destino é, no fim, apenas um supercomputador controlando as vidas dos moradores de El Nido

Vale lembrar que após cumprir a missão de afogar Serge em Another World, Wazuki, agora completamente corrompido por FATE, retorna a Chronopolis para então ser transformado em Lynx, adquirindo uma aparência similar à pantera que atacara Serge quando criança. Sim, o principal antagonista do jogo na maior parte da história é uma versão maligna de um homem que apenas desejava salvar o próprio filho, e descobrir isso já no fim da campanha faz a batalha final entre Serge e Lynx (agora fundido com FATE) ter um significado ainda maior e triste, quando descobrimos toda a verdade.

No fim, é revelado que todo o plano por trás da salvação de Serge e a própria criação de FATE como guardião da Frozen Flame foram obra de Belthasar, o Guru da Razão de Chrono Trigger e criador da Epoch, a nave usada pelos heróis do game de 1995 para as viagens no tempo.

Gameplay a serviço da história, e vice-versa

Como Lavos, diferentemente do que se imaginava ao final de Chrono Trigger, não estava morto, apenas fora do fluxo temporal e fundido com Schala, Belthasar manipulou os eventos do jogo para que chegasse o momento em que Serge e companhia o derrotassem definitivamente e, ao mesmo tempo, libertassem Schala do sofrimento eterno. A batalha final de Chrono Cross, no entanto, exige do jogador algo mais desafiador do que matar a criatura com ataques físicos e magias.

Boa parte da construção do gameplay de Chrono Cross se baseou na manipulação de seis elementos, divididos em três pares antagônicos (azul/vermelho; verde/amarelo; preto/branco), e um sétimo que só podia ser adquirido já na reta final da campanha: o Chrono Cross. Para derrotar o Time Devourer, era preciso usar ataques elementais numa ordem específica (amarelo, vermelho, verde, azul, branco, preto) e finalizar a sequência com o elemento criado por Serge após uma longa jornada.

Como o Time Devourer representa a destruição do contínuo espaço-tempo, matá-lo de modo convencional não desbloqueia o final verdadeiro do jogo. Cada elemento no jogo representa uma nota musical específica, e apenas sua utilização na ordem correta faz ser tocada a melodia da vida, única coisa capaz de destruir Lavos e libertar Schala sem matá-la no processo. No entanto, o próprio Time Devourer usa ataques elementais que podem quebrar a sequência do jogador. Por isso, é preciso induzir à criatura a iniciar acidentalmente a sequência necessária com uma magia elemental amarela, e completá-la antes que o vilão recarregue as energias para um novo ataque.

Na batalha mais importante da campanha, a gameplay de Chrono Cross serve à história mais do que para o simples enfrentamento de um oponente. O maior dos desafios do jogo envolve justamente não matar o último chefe de modo tradicional. Toda a jornada de Serge culminou na criação do Chrono Cross, e o sétimo elemento é justamente a chave para derrotar o Time Devourer e salvar Schala, mas apenas quando harmonizado com os demais elementos que usamos ao longo de toda a campanha para superar nossos oponentes. Poucos jogos na história foram tão engenhosos na construção de um desfecho desse nível para uma campanha.

Desencontros e reencontros... talvez um dia

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No fim da campanha, após finalmente o Time Devourer ser derrotado, Schala e Kid voltam a ser uma só e têm um diálogo final com Serge, ao passo que Home World e Another World também se fundem, eliminando as distorções negativas de cada uma das dimensões e criando uma espécie de "mundo ideal", agora livre da influência de FATE. Serge e todos os seus companheiros de jornada, exceto Schala/Kid, têm suas memórias do que aconteceu ao longo da campanha apagadas, para que possam viver uma vida normal. O protagonista desperta em Opassa Beach ao lado de Leena, mas, mesmo com a mente confusa, parece ainda guardar alguns fragmentos do que viveu em suas viagens por Home e Another World. O que foi desfeito? O que permaneceu? Os personagens antes mortos tiveram seus destinos alterados com a fusão entre as dimensões paralelas. Nunca houve um terceiro Chrono para trazer tais respostas.

O encerramento do jogo é cercado de mistério, pois nele lemos um texto de Schala/Kid escrito para Serge em um diário. Nele, a jovem garante que vai reencontrá-lo, “em algum lugar, em algum tempo”, mas não sabemos onde (ou quando) ela está. No entanto, a última imagem antes dos créditos sugere que o reencontro de fato aconteceu, devido a uma foto que aparece ao lado do diário escrito por Schala. Embora não vejamos Serge por completo na imagem ao lado da jovem, a silhueta e parte do rosto que aparecem nos momentos que antecedem os créditos finais do jogo parecem indicar que se trata mesmo dele. Seria esta uma forma sutil de mostrar que os dois tiveram um final feliz após uma jornada em que, de formas distintas, um personagem salvou o outro? Serge teria morrido ainda criança não fossem as interferências de Schala, e a princesa do Reino de Zeal permaneceria presa a Lavos não fosse a jornada interdimensional do garoto, que também é a nossa por pouco mais de 40 horas.

Hoje, 25 anos após seu lançamento, é seguro afirmar que Chrono Cross não alcançou o mesmo status de popularidade ou aclamação de Chrono Trigger, mas numa indústria que muitas vezes peca por apenas replicar fórmulas de sucesso, a coragem de Masato Kato e seu time para apostar numa trama com poucas respostas óbvias e muitas pequenas histórias dentro de um universo riquíssimo foi responsável por um dos melhores RPGs da história. Um novo capítulo ligando os dois jogos permanece vivo no imaginário de muitos fãs, mas se Chrono Cross marcou mesmo uma despedida da franquia, foi um adeus em grande estilo.

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Author: Corie Satterfield

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